Capa do livro Integrado no programa das comemorações de 25/04, foi apresentado finalmente em Torre de Moncorvo, no auditório da Biblioteca Municipal, o livro do nosso conterrâneo António Sá Gué,
"Ultreia - caminho sem bermas", editado em Novembro de 2010 (como noticiámos aqui neste blogue), com a chancela da Lema d'Origem Editora Ldª. e prefácio do Dr. Alberto (Beto) Areosa, director do agrupamento de escolas de torre de Moncorvo, e cunhado do autor.
Tribuna, no momento da apresentação do livro, pelo Engº. Jorge Afecto A abertura da sessão coube ao Presidente da Câmara de Torre de Moncorvo, Engº. Aires Ferreira, contando com a presença da Chefe de Divisão de Cultura e Turismo, Drª. Helena Pontes e do Engº. Jorge Afecto, amigo do autor, que fez a apresentação do livro, tendo começado por evocar o conhecimento entre ambos, desde o tempo em que cumpriu o serviço militar. Na verdade, o escritor António Sá Gué, nome literário de António Lopes, é, como sabemos, também um ilustre militar de carreira, ao presente com a patente de tenente-coronel.
O autor, António Sá Gué, usando da palavra. Pela excelente abordagem efectuada por Jorge Afecto, deu para se entrever o conteúdo da obra - partindo de uma viagem realmente feita pelo autor em 2008, através do Caminho de Santiago. A partir dessa entra-se numa viagem outra, de cariz simbólico, esotérico e iniciático, em que o seu alter-ego, na pessoa de um Professor (antigo funcionário do "ministério do consumo", departamento da Obrigatoriedade), vai discorrendo sobre o que é e o que deveria ser uma certa "escola" que aqui se pretende que seja o Caminho e a Escola da vida. Cada etapa do caminho suscitou uma série de reflexões, pessoais, intimistas, mas na verdade dirigidas a um grupo de "alunos" ou "aprendizes". São 13 etapas, equivalentes a 13 degraus, no livro correspondentes a 13 capítulos, e, como de professor se trata, abertos com 13 "sumários", onde se explanam as respectivas lições, de uma escola que desde logo se intui que não é uma escola de crianças, na acepção normal do termo.
A mística do Caminho (de Santiago) vai-se revelando na atenção aos símbolos, monumentos, lendas e toda a magia que o envolve e, por consequência, envolve os espíritos que o percorrem, naturalmente os capazes dessa apreensão. Aí nos aparecem Rolando (o da célebre canção medieval) nos desfiladeiros de Roncesvalles, onde, moribundo depois da batalha, quebra num penedo a sua fiel espada, a Durindana... A prossegue a caminhada em demanda do mítico Graal, quiçá o ideal da perfeição a atingir por cada um...
Um aspecto da plateia, num auditório repleto. Segundo o autor, este é um livro que se situa no plano dos princípios. Citando Kant, o objectivo último é o caminho da Liberdade. Discorreu entretanto sobre o caminho físico, o da Peregrinação jacobeia, informando que este é um caminho pré-cristão, redescoberto na Idade Média e se continua a fazer até aos nossos dias, numa busca da espiritualidade. Neste aspecto, o Caminho é uma escola de segredos da transformação da matéria, onde pontuam as igrejas românicas (e posteriores), pontes, etc., incluindo lápides com estranhos sinais que parecem pertencer a chefes de guildas de pedreiros; do mesmo modo o "professor" Daniel procura aí inspiração para a transformação das consciências, base da verdadeira revolução.
Terminou Sá Gué a sua intervenção com uma referência especial à povoação de Cebreiro, onde Wagner se terá inspirado para escrever a ópera "Parcifal". E foi ao som de Wagner que o autor leu o poema final, um hino, decerto inspirado no hino ao Sol do herético faraó Akhenaton, com que termina o livro: "Tu, que todos os dias desces em ti, / que pairas no abismo,/ que te perdes,/ mas renasces, /mostra-nos os truísmos mais banais.// Tu, que contas o tempo./ que és vida e morte,/ Princípio e Fim, / Luz e trevas, /simultaneamente/ mostra-nos o caminho.// Tu, navegante ousado, /torrente ludra,/delta pacífico,/conhecedor de todas as coisas/ agitador de consciências, /Mostra-nos a verdade.// tu que verdadeiramente nasces para todos,/ mesmo para gente que nunca existiu,/ tu, conhecedor do tamanho do mundo,/ Mostra-nos a verdadeira consciência social./ Tu, grande espírito indomável, que nos iluminas, /Tu, Delta luminoso, sobreviverás além da morte./ Nós, meros mortais, brevemente voltaremos ao pó/ E navegaremos, contigo, para sempre, neste mar da vida."
Encontro de escritores do concelho, na hora dos autógrafos: o autor e a Drª. Isabel Mateus, ambos ilustres colaboradores deste blogue Este "Tu" a quem se dirige, é, evidentemente, o Sol, a Luz e a Vida que emanam o disco solar Aton (que Akenaton associa ao deus único, rompendo assim com o politeísmo, e inaugurando a via monoteísta, pretendem alguns que inspirado no deus dos Hebreus, então escravos do Egipto), como tal a Divindade e supremo arquitecto do universo, como se intui da alusão ao "delta luminoso". Interessante que se termine com a imagem de um barco que transporta a mensagem, no fim do Caminho/Mundo, para além do (
ultreia) mar, para o caminho real inca (
cápac ñan), onde, efectivamente os cultos solares tiveram também lugar, como bem o demonstra a chamada "pedra do sol", no ponto mais alto da cidade perdida de Machu Picchu (revelada em 1911, precisamente há 100 anos). Há quem pense que o segredo maior dos Templários seria o conhecimento da existência de terras além-mar, e que a procura do fim do mundo - a Finisterra galega - era a busca do caminho do Sol, ou também do caminho das estrelas, através dessa estrada sideral, a Via Láctea, a galáxia onde fica a nossa casa, a Terra - aliás, a palavra "Compostela" advém de "campus stellae" (campo de estrelas), onde o sepulcro do apóstolo (Sant'Iago, ou Iacob, ou Jacob) se terá manifestado através de luzes... Não será também por acaso que o protagonista do livro se chama Daniel, nome de Profeta, que aqui talvez nos queira deixar a profecia de um novo mundo, mais além - sendo este o significado de "Ultreia" (saudação antiga dos peregrinos de Santiago, e que bem conhecemos da música folk galega, divulgada pelo grupo musical do mesmo nome).
Que nos perdoe o autor o atrevimento por estas conjecturas e extrapolações finais, resultantes da nossa leitura pessoal. - Esperemos que cada qual faça a sua, pois o livro é como uma pedra que salta da mão do autor e vai bater não se sabe onde...
Texto: N.Campos; Fotos: João Pinto Vieira Costa