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segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Emigração - Ilca, uma vida entre Portugal e Suíça

Na edição em português do jornal suíço "on line" Swissinfo, é publicada uma reportagem (datada de Setembro de 2008) em que se conta a história de emigração de uma moncorvense que regressou às suas origens. Como aqui temos publicado diversas histórias de emigração, sobretudo pela pena da nossa distinta colaboradora Professora Isabel Mateus, aqui fica mais este depoimento. É caso para se dizer que há sempre um(a) moncorvese em todo o lado!

«Trás-os-Montes, norte de Portugal. Desde os anos 50, essa região isolada, entre planícies e vales conheceu várias ondas de emigração. Originária de Torre de Moncorvo, Ilca Martinho voltou às suas origens depois de 15 anos na Suíça.
Originária de Torre de Moncorvo, Ilca Martinho voltou às suas origens depois de 15 anos na Suíça.
Em Torre de Moncorvo, região banhada pelo sol, os alto-falantes difundem permanentemente música portuguesa. Nas ruas dessa cidade (três mil habitantes), os carros são matriculados na Suíça, França e Alemanha. O verão é o mês dos imigrantes que vêm passar férias reparadoras em família, na pátria, antes de voltar para o país de acolho.
Ilca Martinho tomou um caminho diferente. Ela voltou a viver em Torre de Moncorvo após ter trabalhado em Sion, trazendo com ela sua filha, Catia. Desde então, Ilca vive dividida entre dois países e dois universos: seu marido trabalha até hoje na Suíça e seu filho vive com uma suíça.
Surpresa pelo interesse despertado pela sua pessoa, Ilca se mostra reticente antes de revelar alguns segredos pessoais. "Tenho 55 anos. Eu tinha 23 ou 24 quando abandonei meu país para seguir meu marido à Suíça, com meu filho de quatro anos. Imagine! Repentinamente eu me vi nas vinhas, eu que, apesar de ser filha de agricultores, nunca havia trabalhado no campo".
Os olhos negros de Ilca piscam maliciosamente. Na sua grande sala repleta de móveis em madeira maciça cobertos de cristais, confortavelmente instalada no seu sofá, ela tenta resumir sua vida entre a Suíça e Portugal.
O casal Martinho, quando chega à Sion em 1982, não tem dificuldade de encontrar emprego. Os contratos de nove meses se encadeiam como mandava a lei em vigor na época, antes de obter o visto de estadia. Ilca, orgulhosa de nunca ter sido ilegal, se candidata para um emprego na empresa relojoeira Swatch e obtém um contrato de operária. Seu marido torna-se motorista de caminhão, profissão que exerce até hoje.
"Eu os visito freqüentemente e meu marido vem dois meses por ano para cá. Hoje em dia é mais fácil de ir para a Suíça".»
Ler mais aqui: http://www.swissinfo.ch/por/Capa/Ilca,_uma_vida_entre_Portugal_e_Suica.html?cid=6891462

domingo, 25 de setembro de 2011

Quadros da Emigração – Por Uma Vida Melhor

A diáspora tem estado presente neste blogue através, sobretudo, dos “Quadros da Emigração”. Por esse motivo, achei pertinente aqui partilhar convosco o recente aparecimento deste testemunho histórico único.
A seguinte peça jornalística de Carina Branco sobre os bairros de lata de França, em Paris, durante os anos sessenta da emigração portuguesa massiva, conta com as fotografias da época de Gérald Bloncourt. Mas não só! O vídeo conta ainda com a revisitação, na actualidade, do mesmo local onde Bloncourt fotografou os portugueses e com eles confraternizou.
Neste vídeo vemos igualmente, pela primeira vez, a capa do livro “A Terra do Chiculate” a caminhar e bem viva por entre o fluxo da emigração em Handaia, 1965.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Quadros da Emigração - Poema: "O Tempo, A Bocarra do Inferno"

O Tempo,
A Bocarra do Inferno

Tempo da Ida

A mente conjectura
Meandros recônditos
De infindáveis caminhos a percorrer,
Porque o Tempo
Se revela infinito
Quando, em cada momento, a ânsia do pensamento percorre,
Desenfreada,
Todas as arestas dos segundos, dos minutos e das horas
e faz a soma
a contar com a contagem mansa, cadenciada dos dias de férias
Tal qual ribeiros cristalinos
A escorrerem tranquilos
sob o sol tórrido
e os zumbidos embriagados das abelhas
pelas longas e intermináveis tardes transmontanas da infância...

Tempo da Estada

Paisagens
Lágrimas
Encontros
E
Desencontros
Fundura
Perplexidade
Anseios
Revolta
Incompreensão...
Fuga
E
Fugacidade
Tal qual bandos de aves
Que levantam voo
Mal chega a hora da debandada
Para territórios quentes ou frios
Onde se exilam no travo amargo do Tempo
Que teima em não chegar...

Tempo da Volta

Paisagens
Rostos
Gestos
Silêncios
Lágrimas
Encantos
E
Desencantos...
Tal é a bocarranha do inferno,
Que o Tempo,
Voraz
E
Traiçoeiro,
Deixou tudo na incompletude
Do ano derradeiro.

Tempo,
Bocarra que (me) devora e tritura
A lisura arreganhada
Do Regresso adiado pelo Tempo.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Livro de Isabel Mateus e Exposição de Francisco Moura, no próximo sábado na biblioteca municipal

(Clicar sobre o convite, para AMPLIAR)

Será apresentado no próximo sábado, dia 27 de Agosto, na Biblioteca Municipal de Torre de Moncorvo o livro de Isabel Mateus, intitulado "A terra do chiculate", o qual versa a problemática da emigração portuguesa (e trasmontana em especial) para terras da mítica Europa (sobretudo para França) - eram as "terras do chicolate", no dizer de um garoto, à época com os pais emigrados. Estará presente a Drª. Maria da Conceição Tina Melhorado, uma das pessoas retratadas no livro, através de uma fotografia do conceituado fotógrafo Gérald Bloncourt (também autor da fotografia da capa). Conceição Melhorado era uma criança nos anos 60, quando seus pais emigraram para França, tendo conhecido na pele os problemas da emigração, o que não a impediu de vencer na vida (ou talvez por isso). - A apresentação do livro estará a cargo de Rogério Rodrigues, também escritor e jornalista, nosso conterrâneo e amigo da autora.

Aproveitamos para informar que o livro "O trigo dos pardais", também de autoria de Isabel Mateus (cujo lançamento noticiámos neste blogue: http://torre-moncorvo.blogspot.com/2010/04/um-sabado-cultural-com-trigo-dos.html), foi incluído no Plano Nacional de Leitura (PNL), programa Ler+, sendo recomendado para os níveis do 8º ano de escolaridade. - Aqui ficam as nossas felicitações à ilustre escritora (nossa conterrânea e colaboradora deste blogue) pelo reconhecimento da sua qualidade por parte das entidades oficiais ligadas ao ensino da Língua Portuguesa.

Ainda no sábado à tarde, depois do lançamento do livro de Isabel Mateus, teremos a inauguração de uma exposição de pintura sob o tema "A aldeia", de autoria de Francisco Moura, mostrando diversos aspectos da aldeia de Carviçais. Esta mostra ficará patente no Centro de Memória (agregado à Biblioteca Municipal).

A não perder!!

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Quadros da Emigração - O Encontro do Emigrante e A Terra do Chiculate em Fafe



Após a apresentação do livro A Terra do Chiculate - Relatos da Emigração Portuguesa em Paris e em Estrasburgo, chegou a hora de regressarmos a Portugal- Fafe.

Por ser uma cidade fortemente bafejada pela emigração, a Câmara Municipal de Fafe deliberou a criação física do Museu das Migrações e das Comunidades, em 2008, embora já existisse como plataforma virtual (www.museu-emigrantes.org) desde Agosto de 2001. Conhecida pela "Fafe dos Brasileiros", donde "Partiram, entre 1836 e 1930, cerca de 8ooo fafenses para o Brasil", o Museu também dá especial relevo à forte emigração que aqui se registou para os países europeus, durante a segunda metade do século XX.

Como mais uma forma de homenagem ao emigrante, realiza-se todos os anos, em Fafe, o Encontro do Emigrante, no dia 12 de Agosto, que conta com a participação de algumas centenas de pessoas. Inicialmente coincidente com a data da apresentação do livro A Terra do Chiculate, este ano o Encontro realiza-se precisamente hoje, dia 5 de Agosto, pelas 18h 30.

Na próxima semana, dia 12, esperamos poder contar com todos os que estiveram presentes no referido encontro e com todos vós. Na apresentação de A terra do Chiculate, em Fafe, temos, porém, como certo o valioso testemunho da "Petite immigrée portugaise" (fotografia de Gérald Bloncourt (Http://bloncourt.over-blog.net/) tirada em 1966, no bairro de lata St- Dennis, e que consta da obra A Terra do Chiculate, p. 86 ), ou seja, de Maria da Conceição tina Melhorado.

Passados 45 anos, Conceição Tina relembrar-nos-á a sua viagem a salto para França em tenra idade, na companhia da sua mãe e do seu irmão, a sua vivência no "bidonville" parisiense e relatar-nos-á, igualmente, o seu recente (re)encontro com Gérald Bloncourt, em Paris, durante o passado mês de Junho.

A história desta "Menina" será apenas mais um dos quadros vivos da emigração, mas, com certeza, um dos mais ricos!...

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Quadros da Emigração – Kennington Park Londres

O marco verde e vermelho da bandeira portuguesa a indicar o caminho para Kennington Park

Relativamente às comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas no Reino Unido, aqui ficam as fotografias que ilustram o evento. Apesar da persistência da chuva, que caiu insistentemente ao longo da manhã e da tarde, ninguém arredou pé e a festa prosseguiu abrigada pelos guarda-chuvas e pelos opulentos chapéus de palha do BPI. Estes últimos por certo mais preparados para protegerem os fregueses do sol tórrido do Verão na pátria de origem, ainda assim não deixaram de aparar, de forma condigna, a chuva do céu. E se, sobre a relva molhada, se assistiu à Missa Campal e à actuação dos Ranchos Folclóricos, também ali se saborearam as mais diversas iguarias (pão com chouriço, bolinhos de bacalhau, bifanas, pastéis de nata...), se bebeu a cerveja Sagres e se tomou o café.
O espetáculo continuou com a música em palco pela tarde dentro, mas a viagem de regresso a casa ainda era longa e, por isso, dabandei com a família. Com os pés húmidos e os corpos enregelados, valeram-nos os pastéis de nata que trazíamos no farnel!...

Visão panorâmica das tascas e do recinto da festa que, mais tarde, viria a encher-se com um pouco menos dos 50 mil portugueses esperados. Talvez por causa da chuva...

A missa campal a (re)lembrar as missões das Descobertas e o coro dos meninos a entoarem cânticos religiosos em português.

Primeiro plano do membro mais pequeno do rancho folclórico português de Londres (Lucy com a sua mãe pouco antes de subir ao palco e, visivelmente, sem disposição para posar para a fotografia).

Este quadro prescinde de legenda...

Pois é, o pessoal à volta dos comes e bebes de Trás-os-Montes. Tudo da melhor marca transmontana, como me informaram!

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Quadros da Emigração – Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas


Festa no Consulado Geral de Estrasburgo para as comemorações do Dia de Portugal (4 de Junho de 2011).

Por ocasião da comemoração do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas convém salientar que há, quanto a mim, duas entradas no Diário de Miguel Torga que são fundamentais para que possamos apreender o verdadeiro significado da data, isto é, que falar de Portugal e da sua história é sinónimo de dizer diáspora.
Encontrando-se ambas no Diário XV (1990), mas distando dois anos no tempo, é basilar que as abordemos separadamente para lhes atribuirmos o justo valor e para dar crédito à coerência e à integridade das palavras do Autor e da sua obra.
A primeira entrada corresponde ao dia 9 de Junho de 1987 quando o poeta se deslocou a Macau para falar de Camões e por altura da iminente transferência do poder administrativo português daquele território para o Governo da China.
Assim, após expressar a enormidade da incumbência que lhe coube na sua qualidade de Poeta, pois fora o escolhido para falar naquela “hora final para que ela não tivesse fim”, e delinear uma abordagem diacrónica do espírito andarilho dos portugueses pelo mundo, cujo nome Camões atinge o expoente máximo, sintetiza a nossa peregrinação como povo de diáspora nos seguintes termos: “É nossa sina não caber no berço. Desde os primórdios que somos emigrantes. O português pré-histórico já era aventureiro, navegador, missionário, semeador de cultura.” (Miguel Torga, Diário XV)
Na sua perspectiva, só desse modo se pode entender o nosso percurso da aventura marítima e a construção do império proveniente da Empresa dos Descobrimentos. De tal maneira que quando se fala em emigrante a referência embate sempre naquele que o personifica: Luís Vaz de Camões. Aliás, citando ainda Torga “Ser um português acabado é ser ele, pioneiro, bandeirante, apóstolo, traficante, visionário, namorado e poeta.” (Miguel Torga Diário XV)
No meu ponto de vista, este trecho do seu Diário não se pode desmembrar daquilo que escreveu posteriormente na segunda entrada do mesmo Volume, em 1989, relativamente à comemoração de mais um 10 de Junho, mas desta vez coincidente com o Prémio Camões, instituído pelos Governos Português e Brasileiro, com que foi agraciado em Ponta Delgada, nos Açores, contando com a presença de Mário Soares. Pelo contrário. Tecendo aqui novamente um elogio ao emigrante português que classificara, em 1987, como “uma criatura convivente, prestante, diligente e influente, que concilia, congrega, desbrava, cria riqueza, funda instituições benemerentes, semeia humanidade”, situa a efeméride na primeira pessoa com a sua própria vivência de migrante em Minas Gerais, no Brasil, para onde emigra, “aos treze anos, numa madrugada de Outubro de 1920” (José de Melo, Miguel Torga – Fotobiobibliografia, 1995). Tal qual o que sucedeu com os seus antecessores, Torga também contrapõe em desfavor de todas as adversidades que a pátria e o berço lhe impõem e que enumera (“Os dons eram escassos, a saúde traiçoeira, o ambiente irrespirável, e os meus propósitos temerários.”) o que, afinal, lhe moldou a vida:
“Só que morava dentro de mim uma vontade férrea, e o instinto e a razão mandavam-me seguir. Queria ser no mundo, como em letra redonda o declarei, um homem, um artista e um revolucionário.” (Miguel Torga, Diário XV)
Ora, nós, os emigrantes de Hoje somos igualmente o arauto da nossa própria diáspora e seguimos à risca o seu ensinamento. Ou melhor, tomando por paradigma a directriz torguiana, fazemos parte desses portugueses com a herança de Camões e a mesma “vontade férrea” de Miguel Torga. Também nós sentimos o apelo de nos cumprirmos fora da Pátria “e o instinto e a razão” mandou-nos seguir para nos tornarmos nos homens e nas mulheres que ajudam a construir a imagem de Portugal no mundo e que, em simultâneo, enriquecem e dignificam o seu país de origem nas diversas vertentes: a económica, a social, a política e a artística.
Somos orgulhosamente portugueses dentro e fora da Pátria!



Música típica no Consulado (as várias gerações e o mesmo amor a Portugal).

terça-feira, 17 de maio de 2011

Quadros da Emigração – Ósculo

Chamando-se Castanheirinho,
Inertes Lhe morreram as galhadas tenras.

Pejado pela chuva e ventoso,
O ósculo chegara-Lhe numa manhã de Abril,
Pela boca voraz e o riso aparatoso
Do pleno ribombar da euforia primaveril.

Chamando-se Castanheirinho,
Inertes Lhe morreram as tenras galhadas.

Ficava a (outra) Vergôntea a tremeluzir
A fragilidade translúcida da verdura
Que, sob os raios de luz, se veio a traduzir
Numa imagem real de candura:

É o ventre do minério rasgado da Serra
Que de novo procria,
É o bafejo doce, cálido e fulvo da terra
Que tudo recria!

Chamando-se Castanheirinho,
Também Lhe (re)nasceram galhadas tenras...


sexta-feira, 25 de março de 2011

Quadros da Emigração – Uma Andarilha Portuguesa em Cheshire (Reino Unido)

Em Cheshire, bati à porta de 68 anos viçosos, sorridentes e meigos, na manhã radiosa de ontem. Assim que transpus a entrada, o mesmo sorriso afável mandou que me sentasse, no asseio do aposento modesto, à volta de uma chávena de chá.
Já em idade avançada, Maria emigrara por razões sentimentais para o Reino Unido. É certo que, em Portugal, teria de continuar a trabalhar até aos 73 anos de idade para ter direito a uma pensão que a deixaria no limiar da pobreza. Mas, de momento, sentia-se ainda com forças para enfrentar o trabalho e, por essa razão, essa não fora a sua maior preocupação.
Recordava-se que, com 25 anos, uma filha nos braços e acompanhada pelo marido, tinha largado pela primeira vez a terra natal rumo à Rodésia, no ano de 1968. Aí, fabricou a sua extensa propriedade até que tudo ficou nas mãos dos nativos e teve de abalar. “Sem nada!”, disse-me de semblante cabisbaixo.
Em 1983, já com mais um filho na algibeira, deslocou-se para a África do Sul, instalando-se em Joanesburgo e, em seguida, em Pretória. Vivia na sua “Farm” e ali cultivava tudo. “Até grelos! Olhe, os mesmos que vi na loja dos chineses, em Manchester!...”
Também aí a conjectura política mudou e resolveram regressar a Portugal para a terra do marido, que ficava muito perto de Lisboa. Aliás, esse fora sempre apenas o seu intento. Carregou continuamente Portugal no coração desde o tempo em que dele se apartara.
A divagação de andarilha portuguesa pelo mundo transportou-a de novo ao ponto inicial da diáspora, quando constatou que a minha perplexidade não compreendia o seu último adeus à pátria portuguesa. Não acompanhara o esposo, que se emaranhou de novo no continente africano. Contudo, o sentimento de mãe e de avó venceu todas as suas resistências de ligação ao cantinho de origem e ei-la numa pequena aldeola de Cheshire, com todos os seus pertences materiais para montar casa e residência vitalícia no país que tão bem a tem acolhido. “Aqui, os Serviços Sociais e de Pensões são estupendos! Estão a tratar de tudo e com muita consideração!”, comentou agradecida.
Por enquanto, trabalha apenas seis horas por semana. Serviços de limpeza. Mas quer mais! Foi a uma entrevista de trabalho para um lar de idosos e tem esperança que consiga ficar. Isto, pela sua independência monetária, por uma casinha sua ao lado da dos filhos e dos seus netinhos, pela reaprendizagem da língua inglesa e do convívio com os vizinhos...
Por vezes, sente falta do sol e da bica, sobretudo à hora do almoço. Por isso, fará, no Verão, uma visita a Portugal, logo que as férias laborais lho permitam!

sexta-feira, 11 de março de 2011

"A Terra do Chiculate" - novo livro de Isabel Mateus, sobre a emigração portuguesa

Sinopse:
A Terra do Chiculate pretende retratar as vicissitudes da emigração portuguesa, maioritariamente clandestina, em França, a partir dos anos 60, e revelar as suas consequências positivas e negativas transportadas até ao presente, quer na pátria, quer no país de acolhimento.

Ao mostrar o difícil passado recente da emigração portuguesa, A Terra do Chiculate alerta, igualmente, para a vigência e a actualidade do tema da emigração clandestina neste início de século.


Synopsis:

The Land of Chiculate – Accounts of emigration portrays the vicissitudes of Portuguese (illegal) immigrants in France during the 1960s and the positive and negative consequences that this remarkable migratory movement caused afterwards in Portugal and the host country.

Although The Land of Chiculate captures the engrained memories of Portuguese immigrants in France, the theme of emigration/immigration is timeless and these accounts might well describe the lives, thoughts and feelings faced by illegal immigrants around the world at the beginning of the new century.


(capa e contra-capa - clicar para ampliar)


.A obra divide-se em três partes e dá voz, através dos seus relatos, na primeira pessoa, aos seus “reais protagonistas”. Deste modo, os protagonistas do livro partilham com o leitor a sua realidade mais íntima que, em muitos casos, ainda não tinha sido exteriorizada, inclusive, no seio da própria família.

Na primeira parte, intitulada “Naufrágio”, a narração da criança, entregue aos cuidados da avó materna, com apenas 12 meses, centra-se nas suas memórias indeléveis da infância e da juventude, exprimindo, sobretudo, o modo como a ausência dos seus pais se reflecte, de forma nefasta, na sua vida. Aliás, a sua experiência individual remete a temática para um panorama mais vasto, pois a sua situação vai ao encontro da mesma realidade familiar e social de tantas outras crianças e jovens do Portugal rural, principalmente do Norte e Interior do país, durante a época da Ditadura.

A segunda parte, “Viagem(ns)”, trata dos percursos de vida daqueles que deram “o salto”, isto é, dos seus sucessos e infortúnios provenientes desta epopeia da era moderna. Entre outras, aqui perpassam as histórias do passador, da criança e dos jovens arrancados à terra de origem, bem como as referentes aos homens e às mulheres e aos seus muitos trabalhos que passaram para se adaptarem ao novo país, à língua e à cultura.

No presente, “os protagonistas” mais idosos desta efeméride deparam-se com outro tipo de problemas: surge o dilema do regresso para Portugal ou da sua permanência em França ou, então, a opção pelo contínuo vaivém entre os dois países, até que as suas forças físicas e psicológicas o permitam.

Quanto às várias gerações de luso-descendentes, debatem-se pela procura e pela afirmação da sua identidade portuguesa, resolvendo deste modo o conflito, por vezes existente, entre o desequilíbrio da influência das culturas francesa e lusa.

A última parte da obra resulta das impressões de viagem do narrador adulto em peregrinação pelos espaços da diáspora dos primeiros emigrantes portugueses, onde se incluem os seus próprios pais, os seus familiares e os seus amigos. A partir daqui, pretende-se que as suas reflexões e considerações elucidem o leitor acerca deste período da emigração ainda mal conhecida por muitos e, até então, com aspectos por desmistificar.


Podemos concluir que nestes relatos as vozes do Passado e do Presente se fundem e se confrontam, tendo o objectivo primordial de dar continuidade ao seu legado da portugalidade no país de acolhimento, ao mesmo tempo que se reafirma a mesma intenção em relação ao território português.



Comentário da Drª. Nathalie de Oliveira, na contracapa (clicar para Aumentar)
Sobre a Autora, nossa conterrânea (e colaboradora deste blogue) Professora Isabel Mateus, e sua Obra, ver: http://www.isabelmateus.com/main.php?title=00_PT&area=0&idx=1


Ficha técnica:

Título: A Terra do Chiculate - relatos da emigração portuguesa.

Autora: Isabel Mateus

Grafismo: Cristina Borges Rocha

Foto da capa: Gérald Bloncourt

Uma obra fundamental sobre um tema da nossa História contemporânea, ainda pouco explorado. E considerando que Trás-os-Montes e Alto Douro (de que a nossa região faz parte) foi um dos grandes focos de emigração, desde os anos 60/70, para a mítica Europa, esta obra é ainda mais oportuna e de maior interesse. - A não perder!


Sobre este tema e de autoria da Isabel Mateus, veja outros "posts" na etiqueta "Emigração", no Arquivo temático deste blogue, na coluna do lado direito (procurar por ordem alfabética).

domingo, 23 de janeiro de 2011

Quadro da Emigração – Reencontros!


Esta fotografia foi tirada por Gérald Bloncourt, em 1966, e correu o mundo português. Bloncourt foi um dos fotógrafos mais famosos a retratar e acompanhar os primeiros portugueses em França durante os difíceis anos da emigração clandestina. A fotografia encontra-se, pela primeira vez e a cores, no seu blogue (http://bloncourt.over-blog.net), donde se pode aceder a uma galeria de imagens extremamente representativas deste período.

Estas são as palavras plenas de emoção que Bloncourt expõe, de peito aberto, no seu blogue, quando reencontrou a menina que fotografara há 45 anos:

"Reencontrei a menina do bairro de lata de St-Denis.
Ela tem 52 anos. É casada e tem três filhos. Ela é professora.
Ela chama-se Maria da Conceição.
Ela vive em Portugal.
Fotografei-a em 1966 no bairro de lata português de St-Denis.
É uma imensa alegria para mim e sinto-me muito emocionado.
O que poderemos fazer para assinalar este reencontro e festejar este acontecimento?
Espero que partilhem comigo esta grande emoção que me sufoca."

Nota: Esta é uma das fotografias que constará do meu próximo livro acerca da emigração. O reencontro do fotógrafo e da menina já se deu após o momento em que Bloncourt me tinha cedido a fotografia para o livro.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Quadros da Emigração - Natal

Quintas do Corisco: O Freixo que durante gerações tem sido esgalhado fundamentalmente para apascentar o rebanho e que, assim o ano o permita, bebe as águas férreas do ribeiro que lhe molha as raízes.


A ancestralidade grandíloqua do Freixo altaneiro que me saúda pela manhã no ecrã do computador apaziguou-me neste Natal a ansiedade que se gera em mim quando não o visito nesta quadra. Apesar de saber de antemão que me esquivarei ao torrão nativo, afinal a minha casa, o meu lar e a minha família também são doutros lugares, não tenho conseguido em anos consecutivos dissipar a apreensão e a vontade de partir. Acabo sempre por fazer a viagem na hora de preparar o Natal. Este ano comecei pela Árvore Ambrosíaca. Às vezes é assim: não me chega ir a Londres buscar o bacalhau, o polvo congelado e as tronchudas. O que desta vez ainda nem fiz!


ÁRVORE de NATAL

Espreito o Freixo
da janela da tecnologia
e do progresso
e apetece-me ataviá-lo
com os enfeites
do Natal:
clicaria sobre a Estrela mais brilhante
que o alumiasse
até à raiz da penumbra,
a Geada que lhe pintasse de branco
o verde-escuro das folhas,
e os sulcos profundos
do velho tronco rugoso
donde jorraria a Ambrosia
para a Consoada da Humanidade.

domingo, 21 de novembro de 2010

Quadros da Emigração – O vaivém continua ... e por quanto tempo?

Estação de camionagem de Grenoble, França, 16 Novembro 2010


Ei-los que regressam mais uma vez! São os mesmos que partirem à procura do pão e que, agora, andam à procura da (última) Pátria.


O convívio inicial da chegada ao local transpôs-se rapidamente para as filas dos assentos do Expresso de luxo. Assim que se sentaram lado a lado, a senhora idosa continuou a conversa com a amiga. A outra replicou-lhe, apropriando-se das suas palavras. Também ia e vinha uma a duas vezes por ano e às temporadas. A cadeira vazia do lado da janela comportava as duas bolsas e os casacos finos de malha a que o ar condicionado da hora de arrancar haveria de dar préstimo para se agasalharem. Subitamente e em consonância, as duas cabeças, praticamente unidas, viraram-se entusiasmadas para a sua direita. O casal vizinho, acomodado na fileira oposta, viajava para uma aldeia não muito distante da delas. Depressa se incendiaram em indagações que acompanhavam perfeitamente a velocidade do veículo a percorrer a estrada em direcção a Portugal. Faladora, a mulher adiantou-se:
“Já vendemos a casa que tínhamos comprado com a intenção de passarmos os nossos últimos dias perto do nosso filho. Até nem havia muito tempo que era nossa... Há coisa de dois a três anos... Mas agora que o filho, a nora e os netos se mudaram para Montpellier o que ficávamos a fazer sozinhos em Paris? Eu e o meu homem ainda andámos com a ideia comprar outra lá em baixo, no Sul. A cidade é bonita e tem um bom clima! Se não fosse pelo Mistral, durante os meses de Inverno, parecia mesmo o clima da nossa terra. Mas íamos voltar ao início?! Outras pessoas, cidade estranha, novos hábitos... Bem sabemos quanto nos custou travar conhecimento quando chegámos! Já não seria tão difícil, mas mesmo assim... Ainda temos a casa em Portugal, os bocados e família. Quando nos apetecer, voltamos em visita de turistas e eles que façam o mesmo! “
“Fizeram bem”, concordou a mesma senhora de idade. “Vê-se que ainda não são velhos e que têm saúde. Gozem mais uns anitos do nosso bom ar! Eu é que não posso dizer o mesmo. A osteoporose obriga-me a tratamentos, operações e já se sabe que em França sou melhor atendida e mais depressa. Além disso, também me fica mais barato. Vou andar neste va-vient France-Portugal enquanto puder.”
A companheira de fileira ia acenando com a cabeça para manifestar a aprovação das suas palavras. Também ela tinha escolhido a mesma modalidade. Entretanto, submergidos pelos pequenos problemas quotidianos que caracterizavam, no presente, a grande preocupação das suas vidas, não anteviram que se juntara outro compatriota à discussão. Idoso, moreno, olhos brilhantes, dançarinos e risonhos, alisava a tez da cara e passava as mãos pelos cabelos finos e brancos. Ia tratar das vinhas no Douro e dos prédios que comprara nos primeiros anos de França. Grande tolo! Moera ali dinheirinho que não recuperaria. Mas não era só isso que o preocupava. A saúde é que se sentia ameaçada todas as vezes que precisava de recorrer ao Centro de Saúde mais próximo da sua aldeia. Contudo, permanecia mais tempo a sulfatar os vinhedos ou a enxertar os bacelos dos socalcos do que em França fechado dentro de casa, ou sentado no banco do jardim a atirar farolos de pão às pombas para se distrair.
A conversa fluía ritmada e sem segredos. O tema desnudava-se aos poucos e, na consciência de cada passageiro, as angústias esbatiam-se e aligeiravam-se, devido à partilha da raiz do mesmo problema: emigração. Quando todos suspiravam de alívio e se acalmavam pelo cansaço de algumas horas de viagem já decorridas, uma voz sumida, vexada e consumida, por ter equacionado inúmeras vezes a questão na intimidade, assumiu de frente o cerne do dilema: “E o que faremos quando não tivermos força para este vaivém?”



domingo, 19 de setembro de 2010

Quadros da Emigração - Imigração

Chegou-me a notícia de Trás-os-Montes de que o Ti Malapeira já não se “astreveu” com a apanha da amêndoa. Chamou os “búlgaros” à jeira e pagou-lhes a jorna a 9 contos, sem almoço incluído. Este ano a amêndoa ainda não ficou nas amendoeiras...


Aguarela de Cristina Borges Rocha

O Malapeira: personagem de Outros Contos da Montanha e símbolo do apego ao terrunho.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Quadros da Emigração - Richmond Park

Mutilação

No topo da colina
sobranceiro e de vigia
mandou que me sentasse.


Tronco forte, robusto e
a brotar seiva,
mais orvalhada ainda
do que a do corte da cabaça,
tem mantido a compostura,
porque bebe nas raízes
da imponente e altiva árvore
que lhe deu a vida.
9 anos se escoaram:
chuva abundante,
neve e geada fria
trespassaram-no
todos os dias.



Agora, sento-me tranquila,
na verdura pascente,
a apreciar-lhe o miolo esfarelado
onde nascem cogumelos
a sugar-lhe o sangue todo
e que, inadvertidamente,
as crianças arrancam.



Assim, compadecida
do seu e do meu sofrimento
desço melhor à Origem
onde se enterra
nosso Tormento.
Isabel Mateus


domingo, 20 de junho de 2010

Quadros da Emigração - Job Centre Plus II

Assim se despovoa o reino ao cheiro de outras canelas…

Mais uma vez no Job Centre Plus.

Portugal estava ali representado por um ventre fecundo, bojudo, cujo “top” florido das papoulas resguardava, e uns olhos, de três anos, velados por entre pestanas recurvas, a fazer-lhe sombra.
A mãe vinha motivada para pedir outros apoios. Agora que estava no final do tempo de gestação, não teria disponibilidade física para se deslocar quinzenalmente ao JobCentre a fim de provar que se encontrava na mesma situação e à procura de emprego. O inquérito da funcionária para o pedido do novo tipo de subsídio escancarava-lhe a vida: há quanto tempo estava no Reino Unido, se já tinha vivido noutros países, quais as suas habilitações literárias, se tinha rendimentos no país de origem…
Mas nada do que ela dissesse responderia ao essencial do caso. O que afinal importava apurar eram os verdadeiros motivos que tinham dado origem à debandada. Por que motivo deixou a pátria, enfrentou um novo país sozinha e, sobretudo, vinha parir numa cama estranha e desacompanhada do autor da façanha? Talvez nestas circunstâncias não se façam públicas tais perguntas e se aja com mais recato e na intimidade. Porém, foi em plena rua e numa língua estrangeira, a Língua Portuguesa, que se contou a verdadeira “história”.
“Eu vivia em Lisboa. Trabalhava ao balcão. Até já ganhava bem, porque era chefe de loja. Mas sabe como é nas cidades grandes… Tudo é caríssimo! A renda da casa avultada. As creches levam preços altos. O pai tem uma licenciatura, mas também não lhe serve de muito. Pouco trabalha e não tem dinheiro. Vim sozinha, com a menina e grávida, ter com a minha irmã. Foi ela quem me animou para o fazer. Dizia-me maravilhas disto, que era muito melhor morar aqui. Saiba que quando nasceu a minha primeira filha fui trabalhar tinha ela apenas 4 meses. A partir dessa altura, tenho trabalhado incansavelmente, mas sem qualquer vantagem. Com o nascimento de mais outro filho, seria ainda pior a vida. Sem tempo para mim, nem para eles. Como já lhe disse, a minha irmã vive aqui com os seus cinco filhos. Não trabalha. Arranjaram-lhe casa, tem ajudas do Governo. Estou a viver com ela, enquanto não me dão também uma a mim. Não está fácil! Estou em lista de espera. Vamos lá ver!... Quero arranjar uma ocupação o mais depressa possível. Pode ser imediatamente após o nascimento do meu filho. Agora ninguém me dá trabalho. Em Setembro, espero realmente ir para o curso de Inglês, na esperança de que o JobCentre me destine uma carreira.”
A um mês do parto, estava sorridente, sentia-se confiante e protegida. A parteira já a tinha ajudado a pedir todos os tipos de subvenções a que tinha direito por lei, desde os cupões para o leite ao montante para o carrinho e o enxoval do bebé. Aliás, já recebera, atempadamente, tudo o que o pacote da maternidade lhe oferecia. Não era fácil, sobretudo porque ainda não tinha casa própria, mas sempre era melhor do que em Portugal!...
Recorrendo à saga da emigração, Portugal continua assim a exportar de leve o Presente e o Futuro da nação!

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Quadros da Emigração - Londres

West Norwood School

Ontem, dia 26 de Maio, almocei na companhia do Tim, um dos responsáveis pelo Festival anual “Readers and Writers”, que ocorre em Lambeth durante o mês de Maio, e do Keith, o jovem bibliotecário da West Norwood Library, num restaurante Português de Lambeth. Sem ementa específica a lembrar a mesa tradicional portuguesa, bebi, contudo, um sumo Compal de maçã e o Tim dirigiu-se ao balcão para pedir um expresso e um pastel de natas. Ficou a saber que a delícia que degustava era o pastel mundialmente conhecido e muito apreciado. Pelos vistos, também por ele. Com aquela pausa para almoço, tipicamente portuguesa, partimos reforçados para a Escola Secundária (West Norwood School), onde nos esperava um grupo de alunos portugueses de mão-cheia. Entretanto, deixámos o Keith na biblioteca a preparar as perguntas que me haveria de colocar, ainda nessa mesma tarde, na sessão de apresentação de Outros Contos da Montanha e a repetir algumas frases em português para agraciar o público em sua língua materna.
Após alguns minutos de espera, vem ao nosso encontro Sam, que é o professor responsável pela realização do evento e acolhimento de Outros Contos da Montanha na Escola. À entrada da sala, duas adolescentes enquanto esperavam discutiam a formação do feminino referente à palavra escritor. Decidiram-se por escritora, mas riam-se dizendo que já não se lembravam. Não seria bem assim, porque foram os dois elementos com maior participação durante a sessão. Perguntaram-me de imediato qual o meu nome e eu perguntei-lhes um a um o de todos, querendo igualmente saber donde vinham. Chegavam de todos os lados, desde a Madeira, Lisboa, Barreiro, Setúbal, Porto… Eu apresentei-lhes a minha terra, a nossa terra, e falei-lhes da vegetação dos nossos montes, da urze e doutras plantas e das pessoas (transmontanas) que inspiraram estes contos. Disse-lhes que me identificava com aquele lugar e que lhes queria mostrar a sua riqueza, as suas tradições, o seu conto da tradição oral… E aí eles foram lendo em voz alta “O Rapaz e a Víbora” . Alguns com alguma dificuldade e outros de forma mais desenvolta, deram alma e vida àquele texto na sua sala de aula. Por fim, à laia de sumário feito no final da lição, perguntei se haveria um voluntário que quisesse resumir a história em apenas algumas frases. Fê-lo uma das meninas da indecisão entre escritor/escritora de forma escorreita e eficaz.
Penso que se colheram frutos, pois dali tiraram-se duas vertentes da mesma moral da história. Uma delas, saída da boca da rapariga e da narradora, diz que não se deve trair a amizade, neste caso o amor e a lealdade à nossa língua, porque é o meio por excelência de identidade e de cultura, ou seja, “a nossa pátria”. A outra, a que o professor proferiu em forma de “confessada” conversa: “Muitos dos alunos que aqui estiveram nunca se atreveram a participar numa aula, nunca leram em voz alta e nem sequer levantaram o braço”. E acrescentou: “Penso que para eles foi muito importante que a sua própria cultura chegasse, batesse à porta e se instalasse na sala de aulas”.
Eu digo obrigada a todos e espero que o interesse permaneça para que possam ler a versão integral do livro que se encontra na Biblioteca da escola.
Continuação de boa leitura!...

quarta-feira, 17 de março de 2010

Emigração na literatura regional - 4

E para (momentaneamente) rematar este tema da emigração na literatura dos autores da região, nada melhor do que ficar com quem suscitou o assunto, ou seja, a Professora Isabel Mateus, respigando um excerto do epílogo do livro "Outros contos da montanha" (2009), intitulado "O lavar dos cestos":

«Regressava para morrer. Mas não sem antes cumprir a promessa. É que o Gandonha já não lhe poderia valer; agora era também ele só espírito no Paraíso e na Terra não havia mais ninguém que lhe saldasse a dívida.
Enquanto longe da Granja não se sentiu sozinha, porque nunca se separou da lembrança, do exemplo, da coragem e da autodeterminação com que os seus moradores enfrentavam as fatalidades e louvavam a alegria, quando também a recebiam. Emigrante torna-viagem trazia na bagagem essa mesma companhia e todas aquelas vivências do contacto com outras culturas e, ainda mais importante, com as pessoas. Muitas das viagens que não fez, completou-as nos livros de escritores-viajantes antigos e modernos e nas conversas que teve com os amigos espalhados pelo mundo.
Chegou nas férias de Verão à casa materna; agora sua e dos seus irmãos. De chave pronta na mão, abriu a porta principal e invadiu o silêncio sepulcral que dali emanava. Numa fúria arrebatada de fazer a luz do dia entrar, escancarou a janela das traseiras, que ligava a moradia ao ar fresco e puro da Serra do Valente. De seguida, num retrocesso premeditado, tirou o ferrolho à da fachada principal e os raios de sol faiscaram pelos quatro cantos da ampla sala. Repetiu este gesto pelos outros compartimentos e, até que a fria aragem da madrugada a aconselhasse que estaria na hora de cerrá-las, não houve fresta que se mantivesse fechada! (...)
Ela morreu realmente ali. Os seus ossos descansam no alto dos Lombinhos onde a torga, a carqueja, a giesta, a esteva, o alecrim, a bela-luz e o rosmaninho lhe aromatizam a sepultura, os pinheiros lhe fornecem a sombra e a abrigam da chuva e os pássaros a entretêm com a sua cantilena».
Tal como na lenda dos elefantes, não raro os que partiram fazem a última viagem para morrer no local de onde saíram.
N.Campos

terça-feira, 16 de março de 2010

Emigração - o aroma da flor do grelo

A filha acabara de chegar de França com o namorado que não entendia patavina de português. Mesmo assim, qual Jacinto queirosiano, acompanhou a "sogra" à horta, enquanto a São ficava por casa, vaidosa do destemido rapazola que se aventurou pela floresta de hortícolas. Nisto, a mulher estranhou o movimento galinácio do pescoço mancebo e, até ao regresso a casa, aguentou o riso, como se levasse uma baciada de roupa debaixo de cada braço.
- Ó filha, então o teu moço andava-me a cheirar as flores dos grelos! Pensa que aquilo é um canteiro, é?!

Dirá o narrador ou mesmo um crítico literário que estamos perante um cruzamento de culturas!

J.C. Verdade verdadinha

Emigração na literatura regional - 3

Impõe-se um esclarecimento que deveria ter sido feito ao início: ao falarmos em "literatura regional" queremos dizer "feita por autores naturais da nossa região, ou com origens nela, e que a ela, a região, se reportam com frequência nas suas obras, inspirando-se nas nossas realidades actuais ou de há muitos anos". De modo algum se poderá fazer uma leitura futebolística - longe de nós! - de haver um escalão "regional" aquém de outras ligas. Até porque A. Sá Gué e Vítor da Rocha são, para nós, escritores de nível nacional, para não falar de mais outro grande escritor que hoje aqui trazemos, a propósito deste tema e que, como veterano, tem uma "internacionalização" de longa data (antes até de começar a ser mais conhecido - felizmente - nos nossos "relvados" da escrita nacional): José Rentes de Carvalho.

J. Rentes de Carvalho foi, de facto, um "emigrante de luxo" que acabou como reputado escritor e professor universitário na Holanda, país que vai repartindo, em termos de afectos e de estadia, com est'outro nosso país trasmontano. Sorte igual não teve o pobre Amadeu "Gato", dos Estevais do Mogadouro, personagem do seu livro "A amante holandesa", que acabou como estivador no porto de Amesterdão, antes de, arrampanado, acabar a guardar cabras nas terras das suas origens. Mas, para aguçar o apetite, aqui fica um trecho em que se relata a odisseia de um "estevaleiro" regressado das Holandas, onde viveu uma paixão assolapada com uma holandesa, de que resultou uma filha que um dia veio conhecer as terras das origens do "pai pródigo":

«Ele gosta de falar de Amsterdam. Do porto. Da gente que, ao vê-la pelos seus olhos e tão diferente da nossa, se me afigura irreal.
'Quem for fraco não se aguenta ali', diz ele, baixando a cabeça e cerrando um instante os olhos, como para afastar recordações penosas.
Ele aguentou-se. Vinte e tantos anos que pareceram longos e agora se lhe afigura terem passado num sopro. Quando lhe deram a reforma veio-se embora, mas hoje...
'Hoje se pudesse, metia-me no avião e em duas horas já lá estava. Eu vejo-os passar aqui por cima da nossa terra, e quando voam naquela direcção digo comigo: olha, mais um que vai para a Holanda. São as saudades, sabe. Também porque deixei lá a outra e a filha'.
'Mas não poderias ao menos...'
Ele, baixando os olhos: 'Escrever não sei. Telefonar também me custa. com certeza nem me entenderiam, porque desde que vim esqueci quase tudo. Mas não, deixe lá... Há-de ser o que Deus quiser'».
in: A Amante Holandesa, editora Escritor, 2003, p. 19.
O "Gato" morreu. Um dia, ao seu confidente e amigo de infância, professor em Bragança, apareceu-lhe uma mocinha holandesa, toda "vamp" e cheia de "piercings", a querer saber coisas sobre o pai português que nunca conheceu. - Se quiser saber o resto, as aventuras e desventuras de um emigrante das nossas terras nas míticas europas civilizadas, e o que aconteceu depois, este livro é obrigatório!
N.Campos