segunda-feira, 12 de julho de 2010

Quadros da Emigração - Richmond Park

Mutilação

No topo da colina
sobranceiro e de vigia
mandou que me sentasse.


Tronco forte, robusto e
a brotar seiva,
mais orvalhada ainda
do que a do corte da cabaça,
tem mantido a compostura,
porque bebe nas raízes
da imponente e altiva árvore
que lhe deu a vida.
9 anos se escoaram:
chuva abundante,
neve e geada fria
trespassaram-no
todos os dias.



Agora, sento-me tranquila,
na verdura pascente,
a apreciar-lhe o miolo esfarelado
onde nascem cogumelos
a sugar-lhe o sangue todo
e que, inadvertidamente,
as crianças arrancam.



Assim, compadecida
do seu e do meu sofrimento
desço melhor à Origem
onde se enterra
nosso Tormento.
Isabel Mateus


5 comentários:

Anónimo disse...

Viva Isabel,
afinal nem só em S. Martinho de Anta, em terras de Sabrosa, havia um Poeta! E como o outro, parece que também este se finou, fosse negrilho (olmo) ou não... - já agora, que árvore era essa?

Em todo o caso, tal como o outro, também este teve direito a uma Poeta (que não Torga, torguiana!), que só canta as árvores finadas quem às raízes dá valor.

Um abraço para as Midlands,
N.

Anónimo disse...

Olá N.!

Obrigada por tão bonito comentário!
Quando eu cheguei, esta árvore só já era tronco. Mas as árvores que o rodeiam são "maple trees", ou seja, ácer ou bordo. Há cerca de 125 variedades dessa espécie e a folha quando vermelha aparece como símbolo proeminente na bandeira do Canadá. Eu gosto imenso das sementes abundantes desta árvore, que parecem duas asas de grilo verdes respectivamente separadas sem o corpo do grilo de permeio. A Giulia gosta imenso de lhes abrir a extremidade(pequena cabeça)para descobrir (cruelmente) o seu interior. Também se podem colocar nas orelhas em forma de brincos como as cerejas.
São árvores frondosas, frescas e há inúmeras a bordejar o parque para dar sombra às crianças depois da brincadeira. A madeira também poderá servir para a construção (naval). Têm grande longevidade e atingem uma grande dimensão. Amanhã perguntarei a um senhor de idade, visita habitual no parque de passeio com a sua cadela Millie, se ainda se lembra da árvore. Assim, também eu ficarei a saber um pouco mais acerca do assunto.

Até breve!

Isabel

Anónimo disse...

Folhas de árvores que andam em bandeiras, sementes que semelham grilos, árvores que poderão ser barcos, parques relvados e sombreados onde crianças brincam e idosos passeiam "dogs" - belos ingredientes para um conto ecológico, em homenagem à árvore decapitada, cuja estória o senhor da cadelinha Millie poderá contar um dia destes: "Once upon a time, a tree in a park..." (estará correcto? - o meu inglês é muito mau). Deixo o resto com a Isabel, com um grande abraço para Stoke-on-Trent,
N.

Anónimo disse...

Obrigada N. pela sugestão da estória. Quem sabe?
O inglês está óptimo.

Um grande abraço.

Isabel

P.S. Ontem estava muito chuvoso e não tive a possibilidade de encontrar o senhor no parque. tentarei hoje ou depois, que o "weather" aqui não está para brincadeiras...

Anónimo disse...

olá Isabel, aguardemos então a possibilidade do dito conto ecológico. Como hipotética fonte de inspiração (para além da informação que possa fornecer o dono da Millie) aqui fica um site muito interessante, onde não falta o poema ao negrilho do M. Torga:
http://arvoresdeportugal.free.fr/OHomemeaArvore/Textos%20literarios/arvoreselliteratura.html

Quanto a esse clima, eu acho que é o "castigo divino" que os deuses lançaram a essa "cínica e bêbada Inglaterra", como dizia o nosso conterrâneo G. Junqueiro, pelas malandrices e piratarias que fizeram ao longo dos séculos. Mas, coragem!, que as férias não tardam e, com elas, o Sol do Sul (da Europa), Itália e Portugal, Moncorvo e Quintas do Corisco, de onde rijos carvalhos lhe acenam na distância, à espera que cada fonte cante à sua porta (de novo com a benção de Torga)...
abraço,
n.