
terça-feira, 16 de março de 2010
Emigração na literatura regional - 3

A Emigração na literatura regional - 2

Este trecho, de autoria de Vítor da Rocha, foi retirado do conto "Argamassa para uma casa", incluído no livro "Na andadura do tempo", editado por ArtEscrita, 2007, pág. 99 (1ª. ed. Campo das Letras, 1997):
«Horácio cresceu quase sem pai, morto onze meses em França e vivendo apenas no mês de Agosto, então regressado ao seio da família e dos conhecidos. De Agosto para Agosto do ano seguinte, Horácio estranhava cada vez mais a vinda daquele homem, que lhe trazia, guardados na mala, por entre roupas e ferramentas novas, chocolates, grossos e compridos, que ele nunca vira iguais na loja do senhor Faustino, e dois ou três brinquedos, um carro a pilhas e um avião, uma carruagem depenada do comboio, uns com tinta fresca e cheiro a novos, outros a ressumirem ferrugem da pubela onde o pai os encontrava. Oferecia-lhe as guloseimas e as prendas, punha-lhe as mãos nos cabelos, beijava-o na face, com os espinhos da barba a picá-lo, e subia as escadas para o interior da casa a fazer festas à sua mãe. Mas as festas terminavam logo nos primeiros dias, iniciando-se depois as discussões, ora em surdina ora em berros sem respeito por ele, passando o resto do tempo a pegar em copos na taberna. Com bebedeira todas as noites, assim o pai de Horácio passava as férias, só voltando a ser o mesmo homem da chegada na hora da partida, quando, os olhos molhados, beijava novamente o filho, acariciava-lhe outra vez os cabelos, e, fechando as malas, já sem as prendas para ele, pegava uma em cada mão e se metia no táxi do senhor Aníbal, um Peugeot 304, a ronronar sonolento à porta, com destino à fronteira de Barca de Alva».
segunda-feira, 15 de março de 2010
A Emigração na literatura regional - 1

«O ti Chico Sá sentou-se no seu canto do escano, abriu o preguiceiro e serviu-se. O Augusto imitou-o. Um nico de tempo depois, à sua voz, todos se calaram:
- Um dia destes, vou para França - disse, procurando dar à voz uma entoação natural, e que simultaneamente não deixasse transparecer que já estava tudo tratado.
Silêncio! Toda a gente virou o olhar na sua direcção, como quem espera mais explicações.
- Vais para onde? - perguntou a Eva.
- Vou para França. Isto aqui não dá nada. Nunca se sai da cepa torta. Quantas peças vendeste hoje na feira? - perguntou, para poder justificar a sua decisão.
- Nenhuma.
- E como é que vais? Ao deus-dará? - inquiria o Chico Sá.
- A salto.
- E quanto custa? E dinheiro?
- Vou pedi-lo emprestado à D. Gertrudes.
- Ó homem! - dizia a Tia Maria Júlia. - Olha que de pobres não passamos e a ricos não chegamos. Por isso não vás! Cá... sabemos com o que contamos, apesar de pouco. Lá... pode até ser mais, não digo que não, mas... o dinheiro não é tudo!... E a língua!... Quem é que os percebe?
Todos estes pensamentos já tinham trespassado o espírito do Augusto do Cabeço. Mas de que outra forma podia um dia aspirar a ter um amendoal nas Arcas? ou um olival na Maria-Moura? Não havia». (obra citada, pág. 18-19)
O certo é que o Augusto abalou mesmo. Vale a pena ler o resto: a saída de Carviçais pela madrugada, a viagem pela estrada de Freixo-Barca de Alva, em direcção a Almeida, com outros companheiros de jornada, como o José Gaio, o Valente e o Bernardo, levados num velho furgão por um passador carrancudo e má-rês. A passagem por brigadas da GNR (previamente controlados) a travessia da fronteira com Espanha em direcção à mítica França, enfim, um relato de leitura obrigatória para se ter uma ideia dos trajectos do "salto", descritos de forma magistral pela pena de A. Sá Gué.
domingo, 14 de março de 2010
Da transmontaneidade

“– Ó montes!, que transfundistes em mim a tua alma sem me pedires autorização.”
sábado, 13 de março de 2010
sexta-feira, 12 de março de 2010
QUADROS DA EMIGRAÇÃO - por Isabel Mateus

Ora, no sábado passado, dia 20 de Fevereiro, à tarde, fui ao encontro dos heróis da aventura da emigração intra-europeia de 60 para França, em Metz. Na belíssima cidade medieval, com vestígios romanos e a sua imponente catedral gótica, acolheu-me a Conselheira Municipal Nathalie de Oliveira, responsável e dinamizadora por este evento, em plena Place Sainte Croix, Salle des Groupes Politiques de Metz, 2. À medida que chegavam, cada um representava a totalidade do país e o pedacinho da sua região. Estavam ali porque tinham sido convocados, para com a sua generosidade e o empenhamento de toda a vida, contarem o que os incitara a abandonar as fragas de Trás-os-Montes e Alto Douro, os quintais verdes do Minho, a insularidade da Madeira e, inclusive, a franja do Litoral.

http://picasaweb.google.fr/NathalieManu57/FotosIsabelMateus?authkey=Gv1sRgCMzJzZ6ys8XzKw#
quarta-feira, 10 de março de 2010
Moncorvo e o Turismo

A propósito das Festividades da Flor da Amendoeira, um dos pontos altos do Cartaz da promoção Turística de Moncorvo, surgiu a oportunidade de trazer aqui alguns extractos do (talvez) primeiro folheto de divulgação turística de Moncorvo. Foi produzido em 1962, com a assinalável tiragem de 10.000 exemplares. Como decerto sabem é nesta altura que se desenvolve o turismo no nosso país, com particular destaque às praias algarvias. Aqui, para além deste folheto, é criado o Posto de Turismo, no edifício anexo ao Cine-Teatro, situado na então principal entrada da vila.

Como se pode observar, são destacados os monumentos maiores do concelho (Igreja Matriz de Moncorvo, Igreja da Misericórdia, Igreja de Santiago de Adeganha, a Porta da Vila, a vila deserta de Santa Cruz da Vilariça), os principais miradouros (Roboredo, Estevais e Lousa), as minas de ferro no Carvalhal, os "costumes" (amêndoa coberta de Moncorvo, tapetes de Urros, "bilhas do Felgar"), a maravilhosa paisagem das amendoeiras floridas (na contracapa do folheto)

Por: Leonardo
terça-feira, 9 de março de 2010
Exposição "O Ciclo da Amêndoa" - até 14 de Março

Apesar do programa das festividades já ter encerrado, esta exposição ainda pode ser visitada no auditório do Museu do Ferro & da Região de Moncorvo até ao próximo dia 14 de Março (próximo fim de semana).
Ver mais: http://parm-moncorvo.blogspot.com/2010/02/exposicao-o-ciclo-da-amendoa-ii.html
A árvore que enganou o diabo

Até que o Diabo, finalmente, avistou uma árvore cheia de flores brancas e rosadinhas.
- Ah! – exclamou ele – ali está a minha salvação. Se é a primeira a dar flor, é também a primeira a dar fruto! Vou-me sentar ao toro e esperar pelo que há-de vir.
E se bem o pensou, melhor o fez, deitando-se a dormir, à espera que lhe caísse o fruto madurinho
Passou um mês e... nada! outro mês e... nada! outro mês e... nada! Já as cerejeiras, as pereiras, as ameixoeiras, as macieiras e todas as outras árvores tinham dado flores e tinham dado os seus frutos e o raio da amendoeira... nada!
Mas o Diabo era teimoso e continuou à espera. Só quando viu que o Verão estava a acabar e que ia passar outro Inverno cheio de fome, é que resolveu desistir e foi encher-se de figos a uma figueira.
Quando o viu partir, já em Setembro, é que a Amendoeira fez amadurecer o seu fruto, a Amêndoa. E ainda por cima fez com que a sua casca fosse bem dura, não fosse o Diabo voltar atrás e nela tentasse ferrar o dente.
É por isso que a amendoeira é a primeira a dar flor e a última a dar fruto. E é também por isso que dizem que a “Figueira é a árvore do Diabo”, porque lhe deu de comer, enquanto a Amendoeira é “a árvore que enganou o Diabo”.
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[Conto popular, com redacção e adaptação de Henrique de Campos]
segunda-feira, 8 de março de 2010
Dia Internacional da Mulher
LENDA DAS AMENDOEIRAS numa versão original "do lado de lá"

Para se ver a versão em castelhano, clicar em: http://labodegadelasolana.blogspot.com/2010/02/la-flor-del-almendro-y-unos-amigos.html
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Aqui fica a tradução:
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“Existe uma lenda em Portugal, originária do Algarve mas estendida por todo o país vizinho, que mistura o amor e as amendoeiras.
Comenta-se nela que um sultão das mourarias casou com uma donzela do Norte. A esta custava-lhe a adaptar-se à cor dos campos do Sul de Portugal até que… por fim, a lenda.
Esta é uma adaptação que dela fez o Marquês dos Mojones, há cerca de uma década, pensando na zona trasmontana e dedicada aos amigos do lado de lá.
LENDA DAS AMENDOEIRAS
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Grande é o risco que corres
Flor de amendoeira, a primeira,
Que com teu amanhecer temporão
Anuncias a Primavera.
Comenta uma lenda em Portugal
Que uma loira casou com um Sultão.
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Divisas do teu miradouro
Escarpada no outeiro
As terras de Trás-os-Montes
Da outra margem do Douro.
Nórdica ela de pais cristãos
A tez branca de campos nevados.
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Trás-os-Montes portugueses
Ladeiras de azeite e vinho
De amendoeiras e laranjais
De corações amigos.
Triste a princesa sempre estava
No seu novo país nunca nevava.
Flor de amendoeira flor de um dia
Flor de delicado aroma
Flor de amendoeira flor de um dia
O Douro a teus pés assoma.
Vendo o sultão tantos soluços
Plantou uma ladeira de amendoeiras [1]
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Amendoeira que te dá a vida
Nesta zona escarpada
Bem plantada entre as vinhas
Ou do alto das penhas.
Contemplando o vale uma manhã
Um sorriso tornou à sua cara.
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Amêndoas de flor de amendoeira
Com açúcar trabalhadas
São em Moncorvo “cobertas”
Em Alba “garrapinhadas” [2]
Talvez fizesse vento nessa manhã
Que o solo cubriu de flores brancas.
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Flores que na primavera
Sacudidas pelo vento
Tornam-se flocos de neve
Branco de amor, sentimento.
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Por: Marqués de Los Mojones
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[1] “Allozos”, no original. Trata-se de um vocábulo existente no castelhano, derivado de
“al-lauza”, nome que os mouros davam às amendoeiras bravias. Não encontrámos tradução em português, pelo que preferimos traduzir por “amendoeiras”, em vez de aportuguesarmos a palavra “allozos”, a qual daria “alouços”, sem que ninguém soubesse o que era.
[2] “Almendras garrapinhadas” – tipo de amêndoa coberta com açúcar que se faz na zona da Alba, perto de Salamanca, e que se poderia traduzir por “encarapinhada”.
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Tradução e Notas: N.Campos
domingo, 7 de março de 2010
Pétalas da Terra
Mesmo com o tempo cinzento, as amendoeiras, que me abraçam sempre que regresso à terra, qual negrilho torguiano, também desta vez, juntando-se todas, sorriram para mim e posaram para a fotografia. Será porque, sempre que as visito, lhes dou uma palavrinha e um afago, seja Inverno ou Verão! Além disso são uma família antiga e ainda não admitiram no seu seio as novatas ditas da CEE. Porque respeitam os valores da tradição e da solidariedade, todas me polvinharam com suas diferentes matizes!
sábado, 6 de março de 2010
VII Feira dos produtos da terra, em Torre de Moncorvo
Esta feira costuma suceder à feira de artesanato, cujo encerramento ocorreu no passado domingo, e conta, como habitualmente, com vários expositores do nosso concelho e do norte do país, apresentando uma variada gama de produtos provenientes do sector agro-alimentar (enchidos, vinhos, queijos, etc), mas também do restante comércio local (vestuário, modas e confecções) e até serviços (relacionados com o turismo).
Esta feira é organizada pela ACIM (Associação de Comerciantes e Industriais de Moncorvo), em parceria com o município.
Hoje e amanhã ainda pode visitar esta Feira, comprando as saborosas iguarias ou produtos aí presentes, e/ou provar um bom prato cá da terra, regado com os nossos melhores vinhos. Fica a sugestão!
sexta-feira, 5 de março de 2010
Conforme as Estações
No Verão as montanhas
Espreguiçam-se na sua imensidão
O céu confunde nas suas entranhas
O amarelo do trigo com sofreguidão
O trigo ceifado
As folhas mortas cobrem o chão
Com as primeiras águas ainda de Verão
Os homens rasgam a terra apoiados ao arado
Caem as geadas certeiras
Rompe o dia com ar cortante
No entanto, com carácter persistente e entusiasmante
As azeitonas são apanhadas das oliveiras
A neve derretida
Brilha o sol no ar
Forçando as amendoeiras a desabrochar
E derramando-se o perfume como coisa prometida.
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Assim aparece Trás-os-Montes… (Isabel Mateus, Évora,1987)
Este foi o poema com que, aos 18 anos, retratei o Portugal rural transmontano, a Minha Terra, no Alentejo, no Jornal de Parede do Lar dos Trigais da Ordem das Doroteias. Poema singelo, descritivo, a emanar autenticidade, brilho e, principalmente, a determinação, coragem e o sacrifício das suas gentes. Talvez por isso, para as recompensar do trabalho árduo e constante ao longo das estações do ano, não considerei a correria desenfreada das águas das ribeiras, nem a “Rebofa”, que este ano, como noutros, também por estes lados acontecem. Pelo contrário, a ênfase recaiu de supetão na essência de Trás-os-Montes: a flor branca ou ligeiramente rósea das amendoeiras.Afinal, elas são a metamorfose do homem transmontano!
Vale a pena visitar Trás-os-Montes, o homem e a sua flora nesta época do ano!...
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Textos de: ISABEL MATEUS
Fotografias: JOÃO PINTO V. COSTA
O céu transmontano
Força!
ANTÓNIO LOPES