domingo, 16 de maio de 2010

Quadros da transmontaneidade (9)

Durante a tarde, em hora que não fira o santo préstito, o futebol há-de ajustar contas com as gentes da aldeia vizinha, ou então, entre solteiros e casados a marcar rivalidades mais benignas, hoje inexistentes e, talvez por isso, substituídas pelas poeirentas mangas de motocross. À saída da igreja formar-se-á uma “ringoleira” de anjos e andores. A banda não faltará logo atrás do santo padroeiro e, um mar de gente segui-lo-á, engrossando à medida que as ruas forem sendo percorridas. As colchas alindarão as varandas e as ruas serão estreitas para tanto devoto. Um foguete, de quando em vez, aterrorizará a passarada e alegrará a canzoada fazendo-os crer que a caça começou. As rezas entremearão com umas marchas musicais em compasso retardante, também elas a fazer-nos regressar ao interior, à nossa condição de mortais, mas que depressa desaparecerá logo à noite, no arraial, depois de se acenderem as luzes. Nas encruzilhadas os mais velhos, que ainda usam chapéu, destaparão a cabeça à passagem do andor, os seus pegadores, à aproximação de um crente a pretender alfinetar a fita com um nota de 50, fazem-no descer ao nível dos humanos, obrigando-os a um exercício de equilíbrio e a um esforço suplementar.Terminará já com as sombras alongadas e uma descarga de morteiros anunciará a todos o seu fim. (Continua…)

ANTÓNIO SÁ GUÉ

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